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    Sobre meu pai


    Desde pequena meu pai dizia que eu precisava de psicólogo e por muitas vezes me pegava parada olhando pra um canto pensando em algo que ele nem sequer imaginava. Acho que eu não pensava em nada, na real.
    Sempre fui muito frágil. Palavras me machucavam muito mais que ações mudas. Fraturei partes do meu corpo por diversas vezes e de bobeira. Doía muito, mas eu até achava divertido ter o braço envolto ao gesso e os amigos da escola escreviam coisas. Uma vez minha mãe desenhou uma flor bem grande e eu fiquei muito triste quando precisei tirar o gesso. Me deu muita raiva daquele doutor idiota que serrou o gesso mirando a flor bem no meio. Mas era legal também quando o gesso todo soltava do meu braço e eu via os riscos de caneta BIC, que usava pra coçar até onde a caneta alcançava.
    Tenho poucas lembranças com meu pai. Posso dizer que poucas boas e muitas de aborrecimento. Meu pai sempre teve o gênio muito difícil de levar, mas inclusive o meu é. Mas é diferente. Gosto de debater, gosto de discutir. Mas com ele, é a palavra dele e ponto.
    Eu ensaiei por várias vezes fazer um #meuamigosecreto e destilar tudo o que é a respeito do meu pai. Mas o que é a respeito é o meu respeito, por ele ser meu pai.
    Na verdade fico um pouco angustiada por nunca ter sido tão próxima dele e lembro só da vez em que me emocionei muito ao vê-lo quilos mais magro na cama de um hospital, passando quase um mês se recuperando de um infarto. Acho que foi a única vez que consegui abraçá-lo. Natal e festividades são como um semi-abraço e um tapinha nas costas. É engraçado isso.
    Tendo meu pai como exemplo, é o tipo de homem que jamais me relacionaria. Acho que não estou só nesse mundo com o que diz sobre o próprio pai. Ele não é um ser horrendo, confesso que é muito engraçado. Mas é dono de uma mente incompreensível e muito amargurada. Não se dá bem com muita gente e raramente ajuda o próximo. Confesso também que por diversas vezes também tive esses pensamentos mas que bom que ainda tive como mudar.
    Enquanto escrevo esse texto ele está na sala vendo TV, é o que mais faz durante o dia. Senão a única coisa.
    Eu fico tentando imaginar o que ele pensa de mim. Minha mãe diz que ele é muito preocupado comigo e me acha triste, mas também não se aproxima. Assim como eu também não. Eu critico muito meu pai pelas suas atitudes... Mas numa sessão de terapia acabei descobrindo que sou o reflexo dele, pelas minhas atitudes e as pessoas que me relaciono. Não que seja um reflexo total dele, mas algo desafiador.
    Deve ser por isso que somos tão iguais e tão diferentes. Eu quero o confronto.
    Eu me enchi de piercings e tatuagens, desaprovados por ele.
    Eu não sou como minha mãe, que é mulher de um homem só. Desaprovado por ele.
    Eu sou de esquerda, ele de direita.
    Mas somos Palmeiras.
    E somos geniosos.
    Damos bom dia sem nos olharmos nos olhos e é a única troca de palavras durante o dia todo. Se não é isso, são discussões sobre o cotidiano. Ou baixo a cabeça pra não ter de levantar a voz quando não concordo com algo...

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